A violência doméstica na primeira pessoa
Hoje ouvi um relato, na primeira pessoa, que foi o maior murro no estômago que tive.
Uma mulher que todos os dias sorri como se fosse a pessoa mais feliz do mundo, que me faz rir todas as tardes. Hoje, sem como nem porquê, confessou que é vítima de violência doméstica.
O marido quis ficar desempregado e não faz nada o dia todo a não ser beber ou ver televisão. Se ela demorar mais a ir para casa, coisa que faz pelo medo de lá chegar, ele vai a todos os cafés até a encontrar e vigiar. Obriga-a a dormir na mesma cama que ele, obriga-a a ser sua mulher. Não será isto chamado de violação?
Já lhe disse várias vezes que quer pedir o divórcio, a última vez no domingo; a resposta é sempre a mesma: ao primeiro pé que puser fora de casa para o fazer, mata-a. Deliberadamente.
Já apresentou em tempos queixa contra ele. Ficou em pena suspensa. O dia do julgamento não a matou por um triz. E ela, por medo, voltou para ele.
Agradece quando a chefe lhe pede para ir trabalhar ao sábado porque é a maneira de não estar sozinha com ele nesse dia. Porque tem medo. Está apavorada.
Disse-me que sabe que vai chegar o dia em que ou ele a mata ou ela o mata a ele. E que ela o mata primeiro. Em legítima defesa.
Ofereci-me imediatamente para ir com ela à polícia. Mas ela já não acredita na justiça. Ofereci-me para a levar a uma instituição que ajude estas vítimas. Disse que não é preciso. Que ela vai resolver o problema.
E, no fim disto, eu sei que este país é mesmo uma merda em questões destas. Só espero que não se resolvam as coisas tarde de mais.